Diretas Já em Curitiba

12 de Jan de 2014

Ao tempo em que eu crescia em Brasília, era comum ver qualquer talento local — em música, em literatura, em qualquer atividade — ser alardeado como alguém de expressão nacional, quando não internacional, por mais medíocre que fosse. Eu sempre atribuí este comportamento a dois fatos: primeiro, a expectativa criada por ser alguém cujo talento se manifestava na capital da República; e, segundo, pela história ainda muito recente de Brasília e pela busca de uma identidade própria.

Mas isso caiu em desuso por lá. O curioso é que, desde que vim para Curitiba, tenho notado marcas deste mesmo comportamento por aqui. A impressão que fica é a de que Curitiba — ou ao menos alguns curitibanos — querem desesperadamente mostrar que a cidade é a flor do Brasil.

Caso em tela: o movimento das Diretas Já em 1983-1984. O G1 publica notícia (abaixo) que afirma “O comício de 1984, em Curitiba, é considerado um marco da luta pela redemocratização do país. De 40 mil a 60 mil pessoas se reuniram na Boca Maldita, com a presença de representantes e lideranças dos movimentos sindical e social e de autoridades políticas como Ulisses Guimarães, Tancredo Neves, o ex-governador do Parana José Richa e ex-prefeito de Curitiba Maurício Fruet. A partir daquele 12 de janeiro, uma onda de manifestações se dissipou no país, em prol das eleições diretas e pela restituição das instituições democráticas.”

Espero que o repórter tenha querido dizer  disseminou  e não  dissipou , mas este não é o ponto. O interessante é atribuir ao comício de Curitiba o papel de  marco  no movimento. Conforme a Wikipedia, foi o oitavo ato público do movimento. Eu na época nem ouvi falar deste comício; meu primeiro contato com o Diretas Já foi duas semanas depois, no comício da Praça da Sé, ao qual eu compareci acompanhado de minha amiga Helena.

O repórter ainda entrevista um morador da cidade que lembra do comício, e que fica feliz porque “o grito acabou sendo ouvido”. Infelizmente a memória trai o entrevistado; a emenda Dante de Oliveira foi rejeitada pelo Congresso, apesar de todas as manifestações públicas pela sua aprovação. Somente cinco anos depois é que tivemos uma eleição direta para presidente da República.

Não sei a que atribuir este comportamento. É possível que Curitiba também esteja em busca de uma identidade própria, ou mesmo de recuperar uma que já teve — afinal, a cidade que já foi um modelo de urbanismo hoje vive de glórias passadas e sofre dos mesmos problemas de falta de planejamento e de falta de infraestrutura de todas as grandes cidades do país. E vivemos um momento em que a retórica facilmente substitui as ações concretas.

http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2014/01/curitibanos-voltam-boca-maldita-para-celebrar-os-30-anos-das-diretas.html

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LC, o Quartelmestre

Também conhecido como Luiz Cláudio Silveira Duarte. Escritor, poeta, pesquisador, jogador, polímata, filômata... está bom para começar.