Organizando meus documentos
Estas novas páginas já estão funcionais, mas o trabalho mal começou. Ainda há muito o que fazer em termos de gerenciamento de software e de informações.
Parte do desafio vem da multiplicidade de documentos digitais no acervo da minha produção. São cerca de dois mil e quinhentos arquivos de texto. Muitos destes são anotações de trabalho, lembretes, e assim por diante, mas isso ainda deixa algumas centenas de textos “prontos”. Ainda há mais alguns milhares de arquivos complementares, quase sempre imagens, áudio ou vídeo.
É a produção de três décadas de trabalho. Manter tudo isso organizado não é trivial. Ao longo destas décadas, a organização foi evoluindo. Inicialmente, eu usava pastas / diretórios em meus discos rígidos, mas o volume de informações cresceu a ponto de tornar isso nada prático.
Afinal, de nada adianta ter uma informação à mão, se ela não pode ser encontrada quando é necessária.
Este não é um problema pessoal meu, claro. Organização da informação é um problema estudado desde a Antiguidade.
Minhas soluções foram evoluindo com a disponibilidade de software livre capaz de ajudar a manter estas informações. Então, uma parte importante do desafio é manter as informações organizadas de modo a facilitar a transição de um sistema em uso para um novo.
Neste caso mais recente, passei as últimas três semanas trabalhando com isso. Como uma amiga querida se interessou pelo processo, resolvi aqui fazer um esboço do que está feito, e do que ainda pretendo fazer.
Vale a pena notar que muito do que se segue é um tanto técnico. Não se incomode em pular as partes chatas e ir direto para a conclusão…
De onde vim…
Atualmente, eu uso um programa chamado Joplin para armazenar e organizar meus textos. Uma grande vantagem dele é estar disponível tanto em meu computador, quanto em meus dispositivos móveis (tablet e celular).
Outra vantagem é que ele não usa um formato proprietário para os documentos, e sim um formato aberto (markdown). Isso quer dizer que, mesmo que este programa desapareça inteiramente, meus documentos podem ser facilmente lidos por qualquer outro programa. Uso markdown há anos para escrever, justamente por esta facilidade de transição de um programa para outro.
O Joplin também é software livre – um ponto essencial para mim.
Muito bem, um bom programa para fazer anotações, seja em minha mesa de trabalho, seja em meus dispositivos móveis – quando estou no trem, por exemplo. Só que sincronizar três dispositivos não é trivial. Por exemplo, de nada adianta eu escrever algo bom no celular, se isso for complicado de passar para o computador. Ou eu posso querer continuar um arquivo, que comecei a escrever no computador, quando eu estiver em uma viagem.
Felizmente, o próprio Joplin oferece sincronização entre os dispositivos. Duas alternativas aqui: eu poderia pagar o serviço de sincronização, mantido pelo criador do programa; ou eu poderia fazer isso por minha conta.
Adivinhe qual opção escolhi?
Eu tenho um computador virtual (“na nuvem”), contratado na Digital Ocean. Ele roda vários programas servidores – por exemplo, lá estão hospedadas as páginas da revista Phenomenology. Humanities and Sciences, editada pelo meu confrade Adriano.
Então, instalei mais um servidor neste computador virtual, para rodar o software de sincronização do Joplin. Com isso, os meus três dispositivos estão sempre sincronizados entre si
Até ontem, eu estava com os meus textos públicos em um serviço chamado Substack. Ele oferecia algumas possibilidades interessantes, mas também tinha várias restrições que me incomodavam bastante. Recentemente, descobri o Ghost, e verifiquei que ele seria útil no meu caso. Fiz vários testes locais e resolvi adotá-lo.
Hora de fazer a migração.
… por onde passei…
Eu poderia ter simplesmente copiado tudo do Substack para o Ghost – que até mesmo tem um serviço de migração especial para o Substack.
Mas isso me deixaria com o potencial de textos conflitantes: versões diferentes no Joplin e no Ghost, ou textos publicados no Ghost que não estariam no Joplin.
E eu não quero ficar amarrado a nenhum destes programas.
Então, resolvi montar um sistema inteiramente independente para manter meus arquivos sincronizados e organizados. O sistema ficou complexo, mas com grande funcionalidade.
O ponto de origem continua a ser o Joplin – é nele que estou escrevendo este texto, por exemplo. Depois que eu acabar de escrever, vou usar tags para marcar o texto e indicar que ele está pronto para ser exportado.
Neste momento, entram em ação alguns scripts (programas que escrevi em Python, uma linguagem de programação). O primeiro deles examina meu servidor Joplin (aquele que coloquei em meu computador virtual) e procura arquivos novos para exportar. Quando os encontra, faz uma cópia em meu computador pessoal.
Esta cópia é colocada em uma pasta especial, organizada por data (ano/mês/dia/). Mas a parte mais importante não a cópia em si, e sim os seus metadados: junto com o arquivo, vai uma série de informações sobre o conteúdo dele – tanto básicas (por exemplo, se é um poema, ou um artigo para o blog) quanto técnicas (por exemplo, qual é o endereço físico do arquivo original no Joplin).
Se há arquivos anexos – imagens ou áudio, por exemplo --, o mesmo script faz cópias remotas deles, em meu servidor de arquivos (mais um dos servidores que roda em meu computador virtual). Depois disso, ele modifica o arquivo local para passar a usar estas cópias remotas, e não cópias locais. Isso me traz a grande vantagem de poder modificar um destes arquivos em um lugar apenas, sem ter que caçar várias cópias diferentes.
Depois de fazer tudo isso, o script atualiza o arquivo Joplin original, para indicar que ele foi devidamente processado.
A partir deste momento, posso rodar outro script Python. Ele procura novos arquivos em meu repositório local, e os envia para o Ghost. Conforme o que eu tenha escrito no arquivo original, ele tanto pode ser publicado imadiatamente, quanto pode ser colocado como rascunho, até que eu faça alguma configuração necessária.
Depois disso, o script modifica a minha cópia local do arquivo, indicando o endereço do Ghost onde ele pode ser encontrado.
… e para onde vou
Como eu disse, ainda falta muito. Ainda nestas páginas, vou colocar meu podcast The Rules Lawyer, e quero criar um sistema de compartilhamento das fotos que fiz nos últimos anos.
Tenho que concluir o serviço de e-mail para os assinantes.
Vou criar outros dois servidores Ghost: um para minha produção em inglês, e outro para meus textos eróticos.
Parte da produção em inglês também vai ser publicada em minha página no Medium, usando os mesmos scripts que fazem a publicação no Ghost.
E ainda vou continuar a programação do projeto ROMAMOR.
Muito trabalho, sim. Envolve organização de informação, programação em Python e em HTML/CSS, manutenção de servidores em containers…
Vale a pena fazer tudo isso, ter este trabalho todo?
Vale – por causa do que eu falei lá em cima: milhares de documentos, e eu não pretendo parar de produzir. Por exemplo, no ano passado, foram 22 poemas, 33 textos no blog, uns trinta contos, dois livros, centenas de fotos e vídeos…
Se eu tiver que organizar pessoalmente, “manualmente”, cada um destes documentos separadamente, vou gastar um tempo enorme com cada um deles. Desta maneira, eu automatizei uns 80% dos procedimentos “burocráticos”, o que me deixa mais tempo criativo nas mãos.
Deixo claro que isso não é um convite, ou um incentivo, a que outros façam o mesmo. Estas são soluções muito pessoais, para atender às minhas necessidades peculiares de organização e de produção.
Até porque não sou modesto: pouquíssimas pessoas dominam o mesmo espectro de competências que me permite fazer todas estas coisas. Escrevo meus textos, faço a edição / diagramação, mantenho a organização, faço edição de imagens e de vídeo, mantenho sete diferentes servidores em um computador virtual e um físico, crio os programas que sincronizam tudo isso, publico os resultados, controlo os pagamentos das assinaturas, mantenho a lista de e-mails para divulgação…
Nada trivial.
Claro, se alguém quiser me contratar para fazer alguma destas coisas, não vou reclamar. Mas já fico muito feliz com uma simples assinatura aqui – melhor ainda se for paga!
Escrevi este texto em parte como resposta à indagação que recebi, sim; mas também como parte de um esforço que venho realizando há tempos. É muito fácil subestimar o trabalho de outra pessoa – ou mesmo ignorá-lo! --, especialmente quando somente uma pequena faceta dele é visível. Qualquer pessoa que faz trabalhos domésticos sabe disso muito bem.
Então, é bom deixar à mostra o que faço. Além disso, como aprendi com Adelaide: se eu não mostrar o meu trabalho e não falar bem dele, ninguém mais o fará.
Obrigado por sua paciência e seu interesse… e agora, volto ao trabalho.