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Reflexões sobre a campanha eleitoral nos EUA.
Há alguns dias, a campanha de Kamala Harris anunciou um comício especial, nesta semana, no qual ela pretende apresentar seus “closing arguments”. Este plano guarda dois fortes golpes em Trump. Primeiro, a expressão remete ao passado dela como promotora de justiça na California, como se fora um julgamento contra o seu adversário condenado criminalmente.
O outro é ainda mais ostensivo, porque o local escolhido para o comício é o Ellipse – o mesmo parque público, em Washington (DC), no qual Trump inflamou a turba para atacar o Congresso, em 6 de janeiro de 2021.
Muito bem. Ontem, Trump respondeu à sua maneira. Fez um grande comício em New York City. Não faz sentido em termos de investimento de campanha, porque Trump não tem qualquer chance de ganhar os votos eleitorais do estado de New York. Mas faz todo o sentido em termos de sua vaidade, porque ele escolheu fazer o comício em uma das principais salas de espetáculo da sua cidade, o Madison Square Garden. Duas das principais redes de TV transmitiram ao vivo o comício, o que certamente afagou seu ego superdesenvolvido.
Mas, assim como o comício de Harris, o comício de Trump tem um significado adicional. Foi no mesmo local que, em 1939, houve o maior comício nazista dos EUA.
E, assim como há 85 anos, os discursos estavam ricos na retórica de ódio racial. Em especial, um dos oradores de ontem referiu-se à ilha de Puerto Rico como “uma ilha de lixo flutuante”, seguindo isso com mais outros insultos diretos a portorriquenhos e latinos.
A reação negativa foi tão avassaladora, que a campanha de Trump fez algo raríssimo: emitiu uma nota dizendo que as palavras do orador não representam o ponto de vista do candidato Trump – que, significativamente, não se manifestou neste sentido, nem quando se dirigiu ao público, nem por suas redes sociais.
Trump tem se esforçado por conseguir votos entre a comunidade latina, e o estardalhaço sobre o comício de ontem é um golpe fortíssimo.
Mas, pessoalmente, sigo mais preocupado com o que significa o resto do comício, assim com o que significa o gigantesco apoio, eleitoral E institucional, que Trump e seus sequazes ainda comandam.
Não consigo parar de pensar na música do Pink Floyd, Waiting for the worms.